Ajahn Jayasaro
Pessimismo, numa acepção mais comum, significa ‘uma tendência para ver o aspecto pior das coisas, ou acreditar que vai acontecer o pior; uma falta de esperança ou de confiança no futuro’, e sob uma perspectiva filosófica: ‘uma crença de que este mundo é tão mau comodeveria de ser, ou de que o mal, emúltima instância, prevalecerá sobre o bem’.
Nenhum destes significados se aplica aos ensinamentos budistas. O Buda ensinou que tudo quanto surge desaparece de acordo com as causas e as condições. Se, numa determinada situação, prevalecerem as causas e as condições para que aconteça o pior, então o pior acontecerá; se prevalecem as causas e as condições para que aconteça o melhor resultado possível, então surgirá o melhor desfecho. Ele enfatizou que se deve aprender a ver tudo com clareza, em vez de se adotarem atitudes unilaterais.
O Buda, ao compreender a natureza causal dos fenômenos, não postulou valores absolutos de bem e de mal, opondo-se entre si numa guerra sem fim. Por isso, há que descartar a ideia de ele ter ensinado o triunfo final de umdos lados da luta, coisa que, primeiro de tudo, ele não reconheceu existir. Os budistas defendem que, se uma xícara de chá tiver um sabor salgado, mesmo que seja o mais desagradável possível, não é uma evidência de um universo essencialmente maligno. É simplesmente o resultado de alguém que se enganou no recipiente, pegando no do sal, em vez do açúcar.
Mas afinal o Budismo não trata só do sofrimento?
O Buda disse que, todos os seus ensinamentos, tradicionalmente contados como 84.000, se poderiam reduzir a apenas dois: sofrimento e o fim do sofrimento. O sofrimento, no sentido de aflição física ou mental, é só a expressão mais grosseira de dukkha. A relação que existe entre a palavra ‘sofrimento’, em Inglês (e em Português), e o conceito de dukkha, em Pāli, pode ser vista como a comparação entre vermelho vivo e cor.
Dukkha também pode ser traduzido como um sentido crónico de ausência, ou como um defeito, ou incompletude de experiência. Neste sentido, dukkha é experiência vista como ‘não-Nibbāna’. Por este motivo, até mesmo os estados mentais mais sublimes ainda são considerados como existindo no domínio de dukkha, porque como são fenómenos condicionados, o apego que se lhes tem não deixa que aconteça a derradeira paz. Posto de uma forma mais simples, dukkha pode ser expresso como ‘uma ausência de verdadeira felicidade’.
O Buda ensinou a via para a cessação do sofrimento, mas enfatizou que a libertação do sofrimento só seria possível, se ele fosse confrontado e completamente compreendido na sua natureza. Na Primeira Nobre Verdade, o Buda afirma que a vida do ser comum não iluminado se caracteriza por dukkha, devido aos anseios que acompanham o desconhecimento de como as coisas são.
É correto dizer que o Budismo nos ensina a renunciar a todos os desejos?
O Budismo distingue dois tipos de desejos: o primeiro (tanhā), a ser abandonado, e o segundo (chanda), a ser cultivado.
Tanhā é o desejo que surge de um mal-entendido básico sobre como são as coisas: o fato de se ver permanência, felicidade e individualidade, onde não existem. O desejo pelos prazeres, a obter através de posse, de descartar algo, e de se tornar em algo, é tanhā. Tanhā leva ao sofrimento pessoal e é a base de quase todos os males sociais.
Chanda é o desejo que surge de uma compreensão correcta de como as coisas são. No seu cerne reside a aspiração à verdade e ao bem. O desejo de fazer bem, de atuar bem, de agir com bondade, de agir com sabedoria – todos os desejos baseados na aspiração à verdade e ao bem conduzem à realização pessoal e a sãs comunidades.
A distinção entre chanda e tanhā não é filosófica, mas psicológica. Ao se observar de perto a crua experiência de vida, a distinção entre desejos que levam à felicidade genuína, e os que não levam, tornar-se cada vez mais clara.
Às vezes esse desejo por algo ou por um objeto dos sentidos (sons, tato, sabor, audiçaõ e visão) pode influenciar no kamma (ou karma), daí terá o que chamamos de kamma-chanda, que também é um tipo de kamma que cai dar frutos, nesta vida ou na próxima vida.

